A Paris de Balzac é uma Paris implacável. Blindada pelo
jogo de interesses do pós-revolução, é um mar revolto e subterrâneo de
interesses disfarçados em rigorosíssimas regras. Como o autor dirá em A Rapariga dos Olhos de Ouro, em Paris,
duas forças sobressaem como cadeias invencíveis que unem todos os seres: o ouro
e o prazer. O Ouro é essa eterna quimera carregada de cargos, partidos,
intrigas – nada resiste ao seu brilho, seja ele puro ou um simples ouropel; o Prazer
é a grande válvula de respiração desta sociedade hermética, onde tudo toma partido,
tudo se cristaliza. Aqui se sucumbe ao cálculo, às voluptuosidades da
embriaguez, aos baptismos de champanhe, aos prazeres do belo sexo – este é o
campo onde todos se deitam a perder sem lamentações. É uma necessidade.
Deste magma infernal, que Balzac afirmou em
permanente erupção, devorador e expedidor de novidades, surge o imprevisto: o
amor, os aplausos sinceros, a amizade incondicional. São as criaturas que
arrastam a sua miséria neste mundo que dividem o espaço dessa comunicação
indecifrável com os outros mundos: o jornalismo corrupto, as coligações políticas,
a violência da alta-roda. É a elas que volta a narrativa, depois de tentar abarcar
todo o espectáculo da comédia humana.